A CNPD emitiu, a 19 de maio de 2020, orientações sobre a medição de temperatura em estabelecimentos de ensino onde se afirma que:
“(…) mesmo que os estabelecimentos de ensino concluam pela verificação em concreto de um fundamento de licitude, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 9.º do RGPD, compete-lhes ainda verificar e demonstrar que os princípios de proteção de dados consagrados no n.º 2 do artigo 5.º do RGPD são em concreto respeitados. Em especial, carece de demonstração a adequação e a necessidade do referido tratamento de dados pessoais de saúde dos alunos, mais a mais tendo em conta a elevada percentagem de casos assintomáticos de infetados pelo coronavírus SARS-CoV-2 e na percentagem de doentes com Covid-19 sem febre (de acordo com os dados da Direção-Geral de Saúde, cerca de dois terços) (…)".
A decisão tem um pendor mais pedagógico do que as orientações emitidas para o controlo da temperatura corporal dos trabalhadores, não concluindo no sentido da incompatibilidade do tratamento com as regras de proteção de dados.
Não encontro razões para existirem diferentes conclusões por parte da CNPD, quando o problema jurídico, na componente da proteção de dados, não se diferencia significativamente.
No essencial, a recolha da temperatura corporal constitui um dado pessoal.
Cumpre notar que a Convenção 108 do Conselho da Europa não mencionava a recolha de dados como componente do tratamento. No direito da União Europeia, particularmente na Diretiva 95/46/CE, ficou expressa que a recolha faria parte das operações de tratamento, a não ser assim um conjunto significativo de ações sobre dados pessoais ficaria fora da esfera protetora, por exemplo, dos direitos de informação e à transparência (artigos 12.º a 14.º do RGPD).
Por outro lado cumpre sublinhar que esta ação não é recomendada pela DGS, o que enfraquece um eventual argumento em favor do interesse legítimo como fundamento de legitimidade.
Não se encontra no artigo 9.º, nº 2 fundamento de legitimidade para fundamentar esta operação e o consentimento não deve ser cogitado dada, na maior parte dos casos, a posição de desequilíbrio entre alunos e estabelecimento de ensino.
Tudo converge para o alastramento de um regime de "obediência de pequenos passos" – “é apenas medir a temperatura” como vocalizam muitos - fundado no interesse público ou na saúde pública.
Mas não se trata disso. O que explica estas intervenções é a aplicação de atos puros de poder sobre o outro. Impor uma obrigação em nome de interesses comunitários.
A biopolítica explica estas metodologias e as culturas políticas orientais dão-lhes imagem.
Não é um bom caminho.